domingo, 10 de maio de 2009

Ultimo Sopro

Estive sempre aqui. Nunca abandonei esta casa...
Naquela manhã em que encontraram o meu corpo já frio, muito embora já o esperassem, mesmo assim, não deixaram de ficar chocados. Afinal, uma morte é sempre uma morte!
O amor, especialmente aquele que não tem cura, é como uma espada afiada e apontada à nossa cabeça, que pode descair a qualquer instante. E a que eu tinha por cima da minha, descaiu durante a noite, tão silênciosamente como quando apareceu sem ser esperada e se instalou confortavelmente à espera que chegasse o momento preciso do meu ultimo sopro de vida.
Foi a minha irmã mais nova quem me encontrou primeiro, quando na sua inocência de criança se abeirou da minha cama para me acordar, na esperança de que naquele dia eu tivesse mais algumas forças e pudesse por fim levantar-me para poder ir brincar com ela às escondidas no jardim. Era tudo o que ela queria!...
Entre choros e soluços, levaram-me o corpo dentro de uma urna branca, mas não puderam levar-me a alma... Essa continua aqui, presa aos sentimentos e às lembranças de quem me concebeu e me deu a vida. A mesma vida que aquela espada gelada me roubou muito antes de ser vivida. Não é justo!

Já partiram todos, mas eu ainda continuo aqui, preso a uma vida que não vivi...
Já só restam os escombros, mas é o único lugar que conheci deste mundo ao qual já não pertenço há séculos, mas que também foi meu.
Talvez um dia me liberte... quando já não restar nada a não ser o pó de uma vaga lembrança. Uma lembrança onde, mesmo assim, ainda permanecerei e farei parte da história de uma casa assombrada, que passou de geração em geração e alguma avó se lembrar de a contar ao seu neto. E será uma daquelas, que inevitavelmente começam sempre por "era uma vez" ...

"Impulsos"

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